15 de dezembro de 2010

A insolvência - O que precisamos saber

1. Quais são os diferentes tipos de processos de insolvência e seus objectivos?

O legislador português definiu “insolvência” como a impossibilidade de cumprimento, por parte do devedor, das suas obrigações vencidas.
As pessoas colectivas e os patrimónios autónomos por cujas dívidas nenhuma pessoa singular responda pessoal e ilimitadamente são também consideradas insolventes quando o seu passivo seja manifestamente superior ao activo.
A insolvência iminente é equiparada à insolvência actual nos casos em que o devedor requeira, em tribunal, a sua declaração.
 Está legalmente previsto um procedimento extrajudicial de conciliação para viabilização de empresas confrontadas com um quadro de insolvência ou colocadas em situação económica difícil. Este processo é conduzido por uma entidade pública: o Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas e ao Investimento (IAPMEI).

Tal procedimento visa conduzir à celebração de um acordo entre a empresa e todos ou alguns dos credores, em termos que viabilizem a sua recuperação.

A pendência de processo judicial de insolvência não obsta ao procedimento de conciliação. Neste caso, se ainda não tiver sido declarada a insolvência, a instância judicial pode ser suspensa, a requerimento da empresa ou de qualquer interessado.

O procedimento é requerido, por escrito, ao IAPMEI, pela empresa ou por qualquer credor que, nos termos do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, tenha legitimidade para requerer a declaração de insolvência da empresa, devendo o requerente invocar os fundamentos da pretensão, identificar as partes que devam intervir e indicar o conteúdo do acordo pretendido.

No acordo podem ainda intervir os sócios da empresa ou outros interessados.

A participação dos credores públicos no procedimento de conciliação é obrigatória desde que a regularização das respectivas dívidas contribua, de forma decisiva, para a recuperação da empresa.
O requerimento a apresentar deve integrar credores que representem mais de 50% das dívidas da empresa. Deve ser apresentado, no prazo de 15 dias após a entrega do requerimento, um plano de negócios que demonstre o carácter adequado do acordo proposto e da afirmação da viabilidade da empresa.
O apontado Instituto deve recusar liminarmente o requerimento de conciliação se entender que:

a) a empresa é economicamente inviável;

b) não é provável o acordo entre os principais interessados na recuperação;

c) não é eficaz a sua intervenção para a obtenção do pacto visado;

d) a empresa não se encontra em situação de insolvência, ainda que meramente iminente;

e) já se encontra ultrapassado o prazo para apresentação à insolvência.

Se o requerimento não for recusado, compete ao IAPMEI promover as diligências e os contactos necessários entre a empresa e os principais interessados, com vista à concretização de acordo que viabilize a recuperação, cabendo-lhe a orientação das reuniões que convocar. As diligências a efectuar podem incluir, nomeadamente, a sugestão de propostas e modelos negociais. Sem prejuízo de contactos directos entre os interessados, o IAPMEI deve acompanhar as negociações, podendo fazer intervir outras entidades para além das indicadas pelo requerente. Em qualquer altura o Instituto pode solicitar ao requerente ou aos interessados a prestação de esclarecimentos ou de informações que considere indispensáveis. A todo o tempo, pode o IAPMEI sugerir ao requerente a modificação dos termos do acordo inicialmente pretendido.

Sem prejuízo da audição dos intervenientes no procedimento de conciliação, o IAPMEI deve analisar, por si ou através de especialistas externos, a viabilidade da empresa e a adequação do ajuste pretendido.
As propostas de acordo podem servir de base a propostas de planos de insolvência ou de pagamentos a apresentar no âmbito de processo de insolvência.

O prazo de conclusão do procedimento, quando não exista processo de insolvência pendente, não deverá exceder seis meses podendo, porém, ser este prazo prorrogado por mais três meses, por uma única vez, mediante requerimento devidamente fundamentado da empresa ou de um dos credores.
A suspensão da instância do processo judicial de insolvência por força do curso do procedimento de conciliação não pode prolongar-se por mais de dois meses.

Em algumas situações legalmente previstas, se o conteúdo da proposta de acordo tiver sido objecto de aprovação escrita por mais de dois terços do valor total dos créditos relacionados pelo devedor, pode a mesma ser submetida ao juiz do tribunal que seria competente para o processo de insolvência para suprimento da manifestação de vontade dos restantes credores e homologação, com os mesmos efeitos previstos no Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas para o plano de pagamentos.
O acordo obtido em sede do procedimento de conciliação deve ser reduzido a escrito, dependendo de escritura pública nos casos em que a lei exija tal formalismo.

O Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas prevê uma única forma processual, não distinguindo entre processos de recuperação de empresa e processos de insolvência.

Cabe aos credores avaliar a viabilidade económica da empresa e decidir, em assembleia, se a mesma deverá ser recuperada ou liquidada e em que termos. Está, ainda, legalmente prevista uma tramitação suplementar relativa à liquidação do património do devedor e à atribuição aos titulares de créditos da faculdade de aprovarem um plano que não passe por tal liquidação.

2. Quais são as condições para a instauração de cada um dos tipos de processo de insolvência?

Conforme se deixou patente, existe apenas um tipo de procedimento de insolvência.
Para que este possa ser despoletado, é necessário que se verifique um quadro fáctico caracterizado pela impossibilidade de cumprimento, por parte do devedor, das suas obrigações vencidas ou, no que respeita às pessoas colectivas e aos patrimónios autónomos, pela existência de passivo manifestamente superior ao activo.

O processo de insolvência pode ser instaurado quando se verifique algum dos seguintes factos:

a) suspensão generalizada do pagamento das obrigações vencidas;

b) falta de cumprimento de uma ou mais obrigações que, pelo seu montante ou pelas circunstâncias do incumprimento, revele a impossibilidade de o devedor satisfazer pontualmente a generalidade das suas obrigações;

c) fuga do titular da empresa ou dos administradores do devedor ou abandono do local em que a empresa tenha a sede ou exerça a sua principal actividade, relacionados com a falta de solvabilidade do devedor e sem designação de substituto idóneo;

d) dissipação, abandono, liquidação apressada ou ruinosa de bens e constitui­ção fictícia de créditos;

e) insuficiência de bens penhoráveis para pagamento do crédito do exequente verificada em processo executivo movido contra o devedor;

f) incumprimento de obrigações previstas em plano de insolvência ou em plano de pagamentos aprovados pelos credores em processo de insolvência já instaurado;

g) incumprimento generalizado, nos últimos seis meses, de dívidas tributárias, de contribuições e quotizações para a segurança social, dívidas emergentes de contrato de trabalho ou da violação ou cessação deste contrato, de rendas de qualquer tipo de locação incluindo financeira, prestações do preço da compra ou de empréstimo garantido pela respectiva hipoteca, relativamente a local em que o devedor realize a sua actividade ou tenha a sua sede ou residência;

h) manifesta superioridade do passivo sobre o activo segundo o último balanço aprovado, ou atraso supe­rior a nove meses na aprovação e depósito das contas, se existir obrigação legal neste sentido, quando o devedor seja uma pessoa colectiva ou um património autónomo.

Podem ser declarados insolventes:

a) quaisquer pessoas singulares ou colectivas;

b) a herança jacente (que é a que foi aberta mas ainda não aceite nem declarada vaga para o Estado);

c) as associações sem personalidade jurídica e as comissões especiais;

d) as sociedades civis;

e) as sociedades comerciais e as sociedades civis sob a forma comercial até à data do registo definitivo do contrato pelo qual se constituam;

f) as cooperativas, antes do registo da sua constituição;

g) o estabelecimento individual de responsabilidade limitada;

h) quaisquer outros patrimónios autónomos.

Excluem-se as pessoas colectivas públicas e as entidades públicas empresariais. Afastam-se, também, as empresas de seguros, as instituições de crédito, as sociedades financeiras, as empresas de investimento que prestem serviços que impliquem a detenção de fundos ou de valores mobiliários de terceiros e os organismos de investimento colectivo, na medida em que a sujeição a processo de insolvência seja incompatível com os regimes especiais previstos para tais entidades.

A declaração de insolvência pode ser requerida em tribunal:

a) pelo devedor enquanto pessoa singular capaz;

b) pelo órgão social incumbido da administração, ou, se não for este o caso, por qualquer um dos seus administradores;

c) por quem seja responsável, por lei, pelas dívidas do devedor;

d) por qualquer credor, ainda que condicional e qualquer que seja a natureza do seu crédito;

e) pelo Ministério Público, em representação das entidades cujos interesses lhe estão legalmente confiados.

A lei portuguesa estabelece regras específicas para as pessoas singulares declaradas insolventes.

Prevê-se, relativamente a estas, a possibilidade de exoneração do passivo não integralmente pago no processo de insolvência ou nos cinco anos posteriores ao seu encerramento. Durante este lapso temporal de cinco anos, a pessoa singular fica a pagar uma quantia aos credores, calculada em função do seu rendimento. Findo esse prazo, o insolvente é declarado desobrigado de todas dívidas incluídas no processo de insolvência, permitindo-se assim a sua reabilitação (princípio do fresh start).

O pedido de exoneração do passivo restante é feito pelo devedor no requerimento de apresentação à insolvência ou no prazo de dez dias contados da citação.

Por outro lado, permite-se às pessoas singulares, não empresários ou titulares de pequenas empresas, apresentar, com a petição inicial do processo de insolvência ou em alternativa à contestação, um plano de pagamentos. Este é sujeito à aprovação pelos credores e, quando sancionado, à homologação pelo juiz, que deverá declarar, igualmente, a insolvência do devedor. Em consequência, o processo de insolvência é encerrado.

O incidente do plano permite poupar a exposição dos seus potenciais beneficiários a toda a tramitação do processo de insolvência, evitar quaisquer prejuízos para o seu bom-nome ou reputação e subtraí-los às consequências associadas à qualificação da insolvência como culposa.

Relativamente à insolvência de pessoas casadas sob regime de bens diferente do de separação, é permitida a sua coligação processual activa e passiva. Apresentando-se ambos à insolvência, ou correndo contra os dois cônjuges o processo instaurado por terceiro, a apreciação da sua situação de insolvência constará da mesma sentença, devendo ser formulada conjuntamente, por eles, uma eventual proposta de plano de pagamentos.

É dada publicidade à sentença de declaração da insolvência através da publicação de anúncio no Diário da República, da afixação de edital à porta da sede e das sucursais do insolvente ou do local da sua actividade, consoante os casos, e no lugar próprio do tribunal. O juiz pode, também, se entender conveniente ou tal for requerido por algum interessado, ordenar outras formas de publicidade que considere adequadas.
Da mesma forma, o despacho de indeferimento liminar que não se baseie, total ou parcialmente, na falta de junção dos documentos, a cessação de funções do administrador da insolvência e a nomeação de outra pessoa para o desempenho do cargo, são objecto de publicidade. Identicamente, a deliberação de aprovação de um plano de insolvência é objecto de imediata publicação.

São, ainda, publicadas a decisão de encerramento do processo, a atribuição ao devedor da administração da massa insolvente, a proibição da prática de certos actos sem o consentimento do administrador da insolvência e a decisão que ponha termo a essa administração.

É, também, publicada a decisão de abertura de um processo a que se referem os artigos 21.º e 22.º do Regulamento (CE) n.º 1346/2000, do Conselho, de 29 de Maio. Verificando-se os pressupostos do reconhecimento da declaração de insolvência, o tribunal português ordena, a requerimento do administrador da insolvência estrangeiro, a publicidade do conteúdo essencial da declaração de insolvência, da decisão de designação do administrador e da decisão de encerramento do processo. Estas publicações são determinadas oficiosamente se o devedor tiver estabelecimento em Portugal.


3. Qual o papel dos vários intervenientes em cada tipo de processo?

O tribunal

O processo de insolvência deve ser instaurado junto do tribunal da sede ou do domicílio do devedor ou, quando esteja em causa a declaração de insolvência de herança jacente, junto do tribunal do domicílio do autor da herança à data da morte.

A declaração de insolvência pode, ainda, ser requerida perante o tribunal do lugar em que o devedor tenha o centro dos seus principais interesses, entendendo-se como tal aquele em que os administre de forma habitual e cognoscível por terceiros.

O tribunal assume o papel axilar de controlo do cumprimento das normas legais que regulam o processo sob análise, cumprindo-lhe, designadamente, proceder à apreciação liminar do pedido de declaração de insolvência e à avaliação da legalidade, para efeitos de homologação, dos planos de insolvência e de pagamentos, aprovados pelos credores.

Cumpre-lhe, também, avaliar a alegada situação de insolvência de um devedor de acordo com os factos colhidos no processo e proferir, caso entenda ser esse o sentido para o qual apontem tais factos, sentença declarando a insolvência, sem que para tal tenha de se pronunciar quanto à recuperabilidade financeira da empresa.

Cabe ao tribunal escolher o administrador judicial provisório e nomear o administrador da insolvência, compreendendo-se nas suas competências substituí-lo e destituí-lo, fiscalizar a sua actividade exigindo-lhe informações sobre quaisquer assuntos ou a apresentação de um relatório do trabalho desenvolvido e do estado da administração e da liquidação, e fixar-lhe prazo para a prestação de contas. Cumpre-lhe, também, nomear a comissão de credores.

É função do juiz convocar, suspender e presidir à assembleia de credores, assim como avaliar as reclamações que tenham por objecto as deliberações desta.

O tribunal determina a apresentação do devedor e procede ao agendamento das diligências processuais, designadamente de tentativa de conciliação, das diligências probatórias e da audiência de discussão e julgamento.

É o juiz que profere sentença de verificação e graduação dos créditos, cabendo-lhe, ainda, nomear curador aos inabilitados, decretar a suspensão da liquidação da massa insolvente e da partilha do produto pelos credores da insolvência.

Ao tribunal cabe, da mesma forma, declarar o encerramento do processo.


O administrador da insolvência

O administrador da insolvência é nomeado pelo juiz que deverá, para tal efeito, atender às indicações do devedor ou da comissão de credores, quando esta exista. Os titulares de créditos podem, contudo, deliberar em assembleia a substituição do administrador nomeado.

Está a cargo do administrador da insolvência, com a cooperação e sob a fiscalização da comissão de credores: a) preparar o pagamento das dívidas do insolvente à custa das quantias em dinheiro existentes na massa insolvente (património do devedor), designadamente das que constituam produto da alienação, que lhe incumbe promover, dos bens que a integrem; b) prover, no lapso temporal intermédio, à conservação e frutificação dos direitos do insolvente e à continuação da exploração da empresa, se for o caso, evitando, tanto quanto possível, o agravamento da sua situação económica.

Exerce pessoalmente as competências do seu cargo, não podendo substabelecê-las em ninguém, sem prejuízo dos casos de recurso obrigatório ao patrocínio judiciário ou de necessidade de prévia concordância da comissão de credores.

O administrador da insolvência, no exercício das respectivas funções, pode ser coadjuvado, sob a sua responsabilidade, por técnicos ou outros auxiliares, incluindo o próprio devedor, mediante prévia concordância da comissão de credores ou do juiz, na falta desta comissão.

Pode contratar os trabalhadores necessários à liquidação da massa insolvente ou à continuação da exploração da empresa, mas os novos contratos caducam no momento do encerramento definitivo do estabelecimento em que tais trabalhadores prestem serviço, ou, salvo convenção em contrário, no da sua transmissão.

Compete-lhe prestar, à comissão de credores e ao tribunal, todas as informações necessárias sobre a administração e a liquidação da massa insolvente.

O administrador da insolvência responde pelos danos que causar ao devedor e/ou aos credores.

O juiz decretará a destituição, com justa causa, do administrador, caso o processo de insolvência não seja encerrado no prazo de um ano contado da data da assembleia de apreciação do seu relatório, ou no final de cada período subsequente de seis meses, salvo havendo razões que justifiquem o prolongamento.


A comissão de credores

A comissão de credores é um órgão de natureza eventual submetido, quanto à sua existência e composição, à vontade da assembleia de credores. Esta pode prescindir da comissão que o juiz haja nomeado, nomear uma caso este não o tenha feito e, em qualquer dos casos, alterar a sua composição.

O tribunal pode não proceder à sua nomeação, quando o considere justificado em atenção à exígua dimensão da massa insolvente, à simplicidade da liquidação ou ao reduzido número de credores.

Quando esta comissão existir, depende do seu consentimento a prática de actos jurídicos que assumam especial relevo para o processo.

Cumpre-lhe cooperar com o administrador da insolvência e fiscalizar a sua actividade, emitindo parecer incidente sobre as contas por este apresentadas.

Este órgão é composto por três ou cinco membros e dois suplentes, devendo o encargo da presidência recair, de preferência, sobre o maior credor da empresa e a escolha dos restantes assegurar a adequada representação das várias classes de credores, com excepção dos subordinados, devendo integrar, obrigatoriamente, um representante dos trabalhadores.

Os membros da comissão de credores eleitos pela assembleia não têm de ser credores e, na sua escolha, tal como na designação do presidente, a assembleia não está vinculada à observância dos critérios referidos no parágrafo anterior.

As suas deliberações são, obrigatoriamente, tomadas por maioria. Delas não cabe reclamação para o tribunal.
Os respectivos membros são responsáveis perante os credores pelos prejuízos resultantes da inobservância culposa dos seus deveres.


O devedor

É obrigação do devedor requerer a declaração da sua insolvência nos sessenta dias seguintes à data do conhecimento dessa situação ou à data em que devesse conhecê-la, excepto quando se trate de pessoa singular que, na data em que incorra em insolvência, não seja titular de uma empresa.

Sendo o devedor titular de uma empresa, a lei presume o conhecimento da situação de insolvência quando se encontrem decorridos três meses sobre o incumprimento generalizado de obrigações tributárias, de segurança social, laborais ou emergentes de contratos de locação.

Durante o curso do processo, o devedor insolvente está obrigado a:

a) fornecer todas as informações relevantes que lhe sejam solicitadas pelo administrador da insolvência, pela assembleia de credores, pela comissão de credores ou pelo tribunal;

b) apresentar-se pessoalmente no tribunal, sempre que a apresentação seja determinada pelo juiz ou pelo administrador da insolvência, salva a ocorrência de legítimo impedimento ou expressa permissão de se fazer representar por mandatário;

c) prestar a colaboração que lhe seja solicitada pelo administrador da insolvência para efeitos do desempenho das suas funções.


O credor

O credor tem supremacia no processo sob análise.
Tem o direito de requerer a declaração de insolvência do devedor e, bem assim, de desistir do pedido ou da instância, desde que não tenha sido ainda proferida sentença.

Se o tribunal indeferir o pedido de declaração de insolvência, pode, desde que tenha sido o requerente, recorrer da decisão.

Tem o direito de participar na assembleia de credores. Nesta, cabe-lhe decidir, com total flexibilidade, quanto ao futuro da empresa, nomeadamente se a mesma deve ser recuperada ou liquidada e em que termos.

Pode aceitar ou recusar o plano de pagamentos, caso o devedor o apresente.

Assiste-lhe a faculdade de requerer a substituição do administrador da insolvência nomeado pelo juiz tendo, quanto à comissão de credores, os poderes acima referenciados.

O direito de recurso está limitado a um grau apenas, ou seja, só é possível recorrer para o tribunal da Relação. Só não é assim nas situações em que ocorra oposição de acórdãos em matéria relativamente à qual não exista ainda uniformização de jurisprudência.


4. Quais são os efeitos da instauração do processo?

A definição da massa insolvente

A massa insolvente abrange, salvo disposição em contrário, todo o património do devedor à data da declaração de insolvência pelo tribunal e, bem assim, os bens e direitos que o devedor adquira na pendência do processo.
Os bens isentos de penhora só são integrados na massa insolvente se o devedor voluntariamente os apresentar e a impenhorabilidade não for absoluta.

O legislador distingue as dívidas da insolvência das dívidas da massa insolvente.

As primeiras correspondem aos créditos sobre o insolvente, cujo fundamento seja anterior à data da declaração de insolvência. São-lhe equiparados ainda os créditos que o credor demonstre ter adquirido no decorrer do processo.

São dívidas da massa insolvente as constituídas no decurso do processo, compreendendo, por exemplo, as custas processuais e a remuneração do administrador da insolvência.


Os efeitos sobre o património do devedor

Relativamente ao património do devedor, a sentença de declaração de insolvência determina que o mesmo fique imediatamente privado, por si ou através dos seus administradores, dos poderes de administração e disposição dos bens que integrem a massa insolvente. A partir desse momento processual, tais poderes ficam investidos no administrador, que assume a representação do devedor para todos os efeitos de carácter patrimonial que interessem à insolvência.

Em regra, os actos praticados pelo insolvente em violação deste regime não produzem quaisquer efeitos.

Só excepcionalmente, e mediante o preenchimento de específicos pressupostos normativos, a administração da massa será assegurada pelo devedor. Neste caso, deverá estar compreendida uma empresa na massa insolvente. É necessário, para tal, que o devedor apresente um plano de insolvência que preveja a continuidade da exploração da empresa por si próprio, bem como que obtenha o consentimento do credor que tenha peticionado a insolvência. Para que o juiz autorize a administração pelo devedor, não deverão existir razões para recear atrasos na marcha do processo ou outras desvantagens para os credores.

Fica interdita ao devedor a cessão de rendimentos ou a alienação de bens futuros susceptíveis de penhora, qualquer que seja a sua natureza, mesmo tratando-se de rendimentos que obtenha ou de bens que adquira posteriormente ao encerramento do processo.

A declaração de insolvência determina o vencimento de todas as obrigações do insolvente não subordinadas a uma condição suspensiva.


Os créditos reclamáveis

Os créditos da insolvência repartem-se por quatro categorias: garantidos, privilegiados, subordinados e comuns.

Os créditos garantidos são os que beneficiam de garantias reais incidentes sobre bens integrantes da massa insolvente até ao montante correspondente ao valor dos bens objecto de garantias. Neles se incluem também os privilégios creditórios especiais. Esta categoria abrange não só os créditos como também os respectivos juros.

Os créditos privilegiados são aqueles que gozam de privilégios creditórios gerais sobre bens integrados na massa insolvente, até ao montante correspon­dente ao valor dos bens objecto desses privilégios, quando eles não se extingam por efeito da declaração de falência.

Os créditos subordinados são aqueles cujo pagamento tem lugar apenas depois de integralmente pagos os créditos comuns.

São créditos subordinados, excepto quando beneficiem de privilégios creditórios, gerais ou especiais, ou de hipotecas legais, que não se extingam por efeito da declaração de insolvência:

a) os créditos detidos por pessoas especialmente relacionadas com o devedor – por exemplo, o cônjuge, ascendentes, descendentes ou irmãos do devedor, quando este seja pessoa singular, ou os sócios, associados ou pessoas que tenham estado em relação de domínio ou de grupo com o devedor, quando este seja pessoa colectiva − e por aqueles a quem estes créditos tenham sido transmitidos nos dois anos anteriores ao início do processo de insolvência;

b) os juros de créditos não subordinados constituídos após a declaração de insolvência, com excepção dos abrangidos por garantia real e por privilégios creditórios gerais, até ao valor dos bens respectivos;

c) os créditos cuja subordinação tenha sido convencionada entre as partes;

d) os créditos que tenham por objecto prestações do devedor a título gratuito;

e) os créditos sobre a insolvência que, como consequência da resolução em benefício da massa insolvente, resultem para o terceiro de má-fé;

f) os juros de créditos subordinados constituídos após a declaração da insolvência;

g) os créditos por suprimentos.
São comuns os créditos não abrangidos nas categorias anteriores.


As medidas provisórias

Havendo justificado receio da prática de actos de má gestão, o juiz, por sua iniciativa ou mediante pedido do requerente, pode ordenar as medidas cautelares que se mostrem necessárias ou convenientes para impedir o agravamento da situação patrimonial do devedor até que seja proferida sentença.

Estas medidas podem, designadamente, consistir na nomeação de um administrador judicial provisório com poderes exclusivos para a administração do património do devedor, ou para assistir o devedor nessa administração.

A adopção das medidas cautelares pode ter lugar previamente à citação do devedor, no caso de a antecipação ser julgada indispensável para não pôr em perigo o seu efeito útil, mas sem que a citação possa em caso algum ser retardada mais de dez dias relativamente ao prazo que de outro modo interviria.

A adopção das medidas cautelares precede a distribuição do processo quando o requerente o solicite e o juiz considere justificada a precedência.

A publicação e a inscrição em registo público português da decisão de abertura de um processo, a que se referem os artigos 21.º e 22.º do Regulamento (CE) n.º 1346/2000, do Conselho, de 29 de Maio de 2000, devem ser solicitadas ao tribunal em cuja área se situe um estabelecimento do devedor. Não sendo esse o caso, devem ser requeridas ao Tribunal de Comércio de Lisboa ou ao Tribunal Cível de Lisboa, consoante a massa insolvente integre ou não uma empresa.


5. Quais são as regras específicas aplicáveis a certas categorias de créditos?

Extinguem-se, com a declaração de insolvência:

a) os privilégios creditórios gerais acessórios de créditos sobre a insolvência, da titularidade do Estado, das autarquias locais e das instituições de segurança social, constituídos mais de doze meses antes da data do início do processo de insolvência;

b) os privilégios creditórios especiais acessórios de créditos sobre a insolvência da titularidade do Estado, das autarquias locais e das instituições de segurança social, vencidos mais de doze meses antes da data do início do processo de insolvência;

c) as hipotecas legais cujo registo haja sido requerido dentro dos dois meses anteriores à data do início do processo de insolvência e que sejam acessórias de créditos sobre a insolvência do Estado, das autarquias locais e das instituições de segurança social;

d) se não forem independentes de registo, as garantias reais sobre imóveis ou móveis sujeitos a registo integrantes da massa insolvente, acessórias de créditos sobre a insolvência e já constituídas, mas ainda não registadas nem objecto de pedido de registo;

e) as garantias reais sobre bens integrantes da massa insolvente acessórias dos créditos havidos como subordinados.

Declarada a insolvência, não é admissível o registo de hipotecas legais que garantam créditos sobre a insolvência, inclusive após o encerramento do processo, salvo se o pedido respectivo tiver sido apresentado em momento anterior ao da referida declaração, ou, tratando-se das hipotecas a que alude a alínea c) do parágrafo anterior, com uma antecedência de dois meses sobre a mesma data.

A partir da declaração de insolvência, é possível a compensação de créditos sobre a insolvência com dívidas à massa, desde que se verifique pelo menos um dos seguintes requisitos:

a) estarem preenchidos, com data anterior à da declaração da insolvência, os pressupostos legais da compensação;

b) ter o crédito sobre a insolvência preenchido antes do contra-crédito da massa os requisitos previstos na lei, ou seja, exigibilidade em tribunal sem que existam razões de natureza processual ou material que obstem ao reconhecimento do direito invocado e incidência das duas obrigações sobre coisas da mesma espécie e qualidade pertencentes à categoria das determináveis em função do seu género, qualidade e quantidade.

A compensação é possível ainda que os créditos e contra-créditos invocados tenham por objecto divisas ou unidades de cálculo diversas, desde que a sua conversão recíproca seja livre no lugar do pagamento do contra-crédito.

Não é admitida a compensação:

a) quando a dívida à massa se tiver constituído após a data da declaração de insolvência;

b) quando o credor tiver adquirido o seu crédito de outrem após aquela data;

c) quando estejam em causa dívidas do insolvente pelas quais a massa não seja responsável;

d) quando se vise compensar dívidas à massa com créditos subordinados sobre a insolvência.

Para os negócios bilaterais ainda não cumpridos, prevê-se, como regra geral, que o respectivo cumprimento fica suspenso até que o administrador da insolvência opte pela sua execução ou pela recusa do seu cumprimento.

Nas situações em que o insolvente tenha celebrado, na qualidade de vendedor, um contrato de compra e venda com reserva de propriedade, permite a lei que a outra parte possa exigir o cumprimento do contrato se a coisa já lhe tiver sido entregue na data da declaração da insolvência. O mesmo regime é aplicável ao contrato de locação financeira e ao contrato de locação com a cláusula de que a coisa locada se tornará propriedade do locatário depois de pagas todas as rendas acordadas, quando seja insolvente o locador.

Quando, em contratos de alienação de coisa determinada, o insolvente seja o comprador, a cláusula de reserva de propriedade só é oponível à massa se tiver sido reduzida a escrito até ao momento da entrega da coisa.

No caso de insolvência do promitente-vendedor, o administrador da insolvência não pode recusar o cumprimento de contrato-promessa com eficácia real, se já tiver havido transmissão da coisa a favor do promitente-comprador.

A declaração de insolvência não suspende o contrato de locação em que o insolvente seja locatário, mas o administrador pode sempre pôr-lhe termo com um pré-aviso de sessenta dias se, nos termos da lei ou do contrato, não for suficiente um pré-aviso inferior. Não será assim se o locado se destinar à habitação do insolvente, caso em que o administrador da insolvência poderá apenas declarar que o direito ao pagamento de rendas vencidas depois de transcorridos sessenta dias sobre tal declaração não é susceptível de ser exercido no processo de insolvência, ficando o senhorio, nessa hipótese, constituído no direito de exigir, como crédito sobre a insolvência, indemnização dos prejuízos sofridos em caso de despejo por falta de pagamentos de alguma ou algumas das referidas rendas, até ao montante das correspondentes a um trimestre.

A declaração de insolvência não suspende também a execução de contrato de locação em que o insolvente seja locador, e a sua denúncia por qualquer das partes apenas é possível para o fim do prazo em curso, sem prejuízo dos casos de renovação obrigatória.

A declaração de insolvência do trabalhador não suspende o contrato de trabalho. A reparação dos prejuízos decorrentes de uma eventual violação dos deveres contratuais apenas pode ser reclamada ao próprio insolvente.

Sem prejuízo de disposição diversa do contrato, o agrupamento complementar de empresas e o agrupamento europeu de interesse económico não se dissolvem em consequência da insolvência de um ou mais membros do agrupamento. O membro declarado insolvente pode exonerar-se do agrupamento complementar de empresas. É nula a cláusula do contrato que obrigue o membro declarado insolvente a indemnizar os danos causados aos restantes membros ou ao agrupamento.

As regras enunciadas são de carácter imperativo não podendo, em consequência, ser afastadas por convenção das partes.

O pagamento dos créditos sobre a insolvência apenas contempla os verificados por sentença que já não seja objecto de recurso.

Os créditos são objecto de graduação, ou seja, de definição de relações de precedência, sendo tal graduação geral para os bens da massa insolvente e especial para os bens a que respeitem direitos reais de garantia e privilégios creditórios. Na graduação de créditos não é atendida a preferência resultante de hipoteca judicial, nem a proveniente da penhora, mas as custas pagas pelo autor ou exequente constituem dívidas da massa insolvente.

Liquidados os bens onerados com garantia real, e abatidas as correspondentes despesas, é imediatamente feito o pagamento aos credores garantidos, com respeito pela prioridade que lhes caiba; quanto àqueles que não fiquem integralmente pagos e perante os quais o devedor responda com a generalidade do seu património, são os saldos respectivos incluídos entre os créditos comuns, em substituição dos saldos estimados, caso não se verifique coincidência entre eles.

O pagamento dos créditos privilegiados é feito à custa dos bens não afectos a garantias reais prevalecentes, com respeito da prioridade que lhes caiba, e na proporção dos seus montantes, face aos que sejam igualmente privilegiados.

O pagamento aos credores comuns tem lugar na proporção dos seus créditos, se a massa for insuficiente para a sua satisfação integral.

O pagamento dos créditos subordinados só tem lugar depois de integralmente pagos os comuns, e é efectuado de acordo com uma ordem legal e na proporção dos respectivos montantes, se a massa for insuficiente para o seu pagamento integral. No caso de subordinação convencional, é lícito às partes atribuírem ao crédito uma prioridade diversa da legalmente prevista.

Sempre que haja em depósito quantias que assegurem uma distribuição não inferior a 5% do valor de créditos privilegiados, comuns ou subordinados, o administrador da insolvência judicial apresenta, com o parecer da comissão de credores, se existir, para ser junto ao processo principal, o plano e mapa de rateio que entenda dever ser efectuado. Neste contexto, o juiz decide sobre os pagamentos que considere justificados.

Quando, além do insolvente, outro devedor solidário com ele se encontre na mesma situação, o credor não recebe qualquer quantia sem que apresente certidão comprovativa dos montantes recebidos nos processos de insolvência dos restantes devedores; o administrador da insolvência dá conhecimento do pagamento nos demais processos. O devedor solidário insolvente que liquide a dívida apenas parcialmente não pode ser pago nos processos de insolvência dos condevedores sem que o credor se encontre integralmente satisfeito.

Os créditos sob condição suspensiva são atendidos pelo seu valor nominal nos rateios parciais devendo, porém, na pendência da condição, continuar depositadas as quantias que por estes lhes sejam atribuídas.


6. Quais são as regras aplicáveis aos actos prejudiciais?

A lei prevê, como regra geral, que todos os actos praticados nos quatro anos anteriores à data do início do processo de insolvência podem ser resolvidos caso diminuam, frustrem, dificultem, ponham em perigo ou retardem a satisfação dos credores.

Por regra, a resolução pressupõe a má fé do terceiro, a qual se presume quanto a actos cuja prática ou omissão tenha ocorrido dentro dos dois anos anteriores ao início do processo de insolvência e em que tenha participado ou de que tenha aproveitado pessoa especialmente relacionada com o insolvente, ainda que a relação especial não existisse a essa data.

A referida má-fé consiste no conhecimento, à data da prática ou da omissão do acto, de qualquer das seguintes circunstâncias:

a) de que o devedor se encontrava em situação de insolvência;

b) do carácter prejudicial do acto e de que o devedor se encontrava, à data, em situação de insolvência iminente;

c) do início do processo de insolvência.

São resolúveis em benefício da massa insolvente, sem dependência de quaisquer outros requisitos, os actos que se passam a indicar:

a) partilha celebrada menos de um ano antes da data do início do processo de insolvência em que o quinhão do insolvente tenha sido essencialmente preenchido com bens de fácil sonegação, cabendo aos co-interessados a generalidade dos imóveis e dos valores nominativos;

b) actos celebrados pelo devedor, a título gratuito, dentro dos dois anos anteriores à data do início do processo de insolvência, incluindo o repúdio de herança ou legado, com excepção dos donativos conformes aos usos sociais;

c) constituição, pelo devedor, de garantias reais relativas a obrigações preexistentes ou de outras que as substituam, nos seis meses anteriores à data de início do processo de insolvência;

d) fiança, subfiança, aval e mandatos de crédito, em que o insolvente haja outorgado no período referido na alínea anterior e que não respeitem a operações negociais com real interesse para ele;

e) constituição, pelo devedor, de garantias reais em simultâneo com a criação das obrigações garantidas, dentro dos sessenta dias anteriores à data do início do processo de insolvência;

f) pagamento ou outros actos de extinção de obrigações com vencimento posterior à data do início do processo de insolvência, ocorridos nos seis meses anteriores ao momento temporal de início do processo de insolvência, ou depois deste mas anteriormente ao vencimento;

g) pagamento ou outra forma de extinção de obrigações efectuados dentro dos seis meses anteriores à data do início do processo de insolvência em termos não usuais no comércio jurídico e que o credor não pudesse exigir;

h) actos a título oneroso realizados pelo insolvente dentro do ano anterior à data do início do processo de insolvência, em que as obrigações por ele assumidas excedam manifestamente as da contraparte;

i) reembolso de suprimentos, quando tenha lugar dentro do mesmo período referido na alínea anterior.

O regime descrito no parágrafo anterior cede perante normas legais que excepcionalmente exijam sempre a má fé ou a verificação de outros requisitos.

Os actos de qualquer destes tipos presumem-se prejudiciais à massa, sem admissão de prova em contrário, ainda que praticados ou omitidos fora dos prazos aí contemplados.

A resolução pode ser invocada pelo administrador da insolvência, mediante o envio de carta registada com aviso de recepção nos seis meses seguintes ao conhecimento do acto, desde que não se encontrem decorridos mais de dois anos sobre o momento da declaração de insolvência. Enquanto, porém, o negócio não estiver cumprido, pode a resolução ser declarada, sem dependência de prazo.

Essa invocação pode ter lugar ainda que estejam em causa transmissões sucessivas de bens ou de direitos da massa insolvente, desde que os transmissários estejam de má-fé, sejam sucessores a título universal ou tenham adquirido aqueles a título gratuito.

A resolução de actos pode ser impugnada no prazo de seis meses.

Uma vez resolvidos, com efeitos retroactivos, os actos prejudicais à massa insolvente, deve ser reconstituída a situação que existiria se o acto não tivesse sido praticado ou omitido.


7. Quais são as condições de reclamação e admissão dos créditos?

A sentença declaratória da insolvência fixa um prazo, até trinta dias, durante o qual os credores devem reclamar a verificação dos seus créditos. O referido prazo conta-se, para os credores conhecidos, da data da sua citação ou notificação. Para os demais, o lapso temporal definido é acrescido da dilação de cinco dias e começa a correr a partir da publicação do último anúncio no Diário da República ou num jornal diário de grande circulação nacional.

Para efeitos de reclamação de créditos, a sentença é notificada, nos termos da lei processual civil, ao requerente, quando seja credor, ao Ministério Público e à comissão de trabalhadores, quando exista, procedendo-se, relativamente aos demais interessados, à respectiva citação. Quando não exista comissão de trabalhadores, é transmitido o conteúdo da sentença mediante a afixação de editais na sede e nos estabelecimentos da empresa.

Os cinco maiores credores conhecidos, com exclusão do requerente, são citados pessoalmente, nos termos previstos na lei processual civil, ou por carta registada, consoante tenham ou não residência habitual, sede ou domicílio em Portugal.

Os credores conhecidos com residência habitual, domicílio ou sede em outros Estados-Membros da União Europeia e, bem assim, o Estado e os institutos públicos sem a natureza de empresas públicas ou de instituições de segurança social, quando credores, são também citados por carta registada.

Dentro do prazo fixado para o efeito na sentença declaratória da insolvência, devem os credores da insolvência, incluindo o Ministério Público na defesa dos interesses das entidades que represente, reclamar a verificação dos seus créditos por meio de requerimento, acompanhado de todos os documentos probatórios de que disponham, no qual indiquem:

a) a sua proveniência, data de vencimento, montante de capital e de juros;

b) as condições a que se encontrem subordinados;

c) a sua natureza comum, subordinada, privilegiada ou garantida e, neste último caso, os bens ou direitos objecto da garantia e respectivos dados de identificação registral, se aplicável;

d) a existência de eventuais garantias pessoais e identificação dos seus titulares;

e) a taxa de juros de mora aplicável.

O requerimento é endereçado ao administrador da insolvência e deve ser entregue ou enviado, por via postal registada, para o domicílio profissional do mesmo.

A verificação tem por objecto todos os créditos incidentes sobre a insolvência, qualquer que seja a sua natureza e fundamento, e mesmo o credor que tenha o seu crédito reconhecido por decisão definitiva não está dispensado de o reclamar no processo de insolvência, se nele quiser obter pagamento.

Findo o prazo para reclamar créditos, o administrador da insolvência dispõe de quinze dias para apresentar, na secretaria do tribunal, uma lista de todos os credores por si reconhecidos e outra dos não reconhecidos, com indicação dos motivos justificativos do não reconhecimento. Devem ser incluídos nestas listas não só os credores reclamantes mas também aqueles cujos direitos constem dos elementos da contabilidade do devedor ou sejam, por outra, forma do conhecimento do administrador.

É obrigação do administrador da insolvência avisar do conteúdo da sua decisão, mediante carta registada, os credores não reconhecidos e aqueles cujos créditos tenham sido reconhecidos sem que os tenham reclamado ou que tenham sido objecto de reconhecimento em termos diversos dos da reclamação. O administrador deverá atender, no cumprimento desta obrigação, ao disposto nos artigos 40.º a 42.º do Regulamento (CE) n.º 1346/2000, do Conselho, de 29 de Maio, tratando-se de credores com residência habitual, domicílio ou sede em outros Estados-Membros da União Europeia que não tenham já sido citados nos termos da lei portuguesa.

Se não houver impugnações, é de imediato proferida sentença de verificação e graduação dos créditos na qual, salvo se existir erro manifesto, se homologa a lista de credores reconhecidos elaborada pelo administrador da insolvência e se graduam os créditos em atenção ao que conste dessa lista.

Qualquer interessado pode, porém, mediante requerimento dirigido ao juiz apresentado nos dez dias seguintes ao termo do prazo de quinze dias, impugnar a lista de credores reconhecidos. Tal pretensão pode ter por fundamento a indevida inclusão ou exclusão de créditos ou a incorrecção do montante ou da qualificação dos créditos reconhecidos.

O administrador da insolvência e qualquer interessado que assuma posição contrária, incluindo o devedor, podem responder às impugnações nos dez dias subsequentes ao termo do prazo conferido para a impugnação ou à notificação ao titular do crédito objecto da impugnação, consoante o caso, sob pena de a impugnação ser julgada procedente.

Se a impugnação se fundar na indevida inclusão de certo crédito na lista de credores reconhecidos, na omissão da indicação das condições a que se encontre sujeito ou no facto de lhe ter sido atribuído um montante excessivo ou uma qualificação de grau superior à correcta, só o próprio titular pode responder.

Com as impugnações e as respostas devem ser oferecidos todos os meios de prova (por exemplo, os documentos e a identificação das testemunhas que o requerente apresentará em tribunal).

Findo o prazo de resposta, a comissão de credores deve juntar ao processo, em dez dias, parecer sobre as impugnações.

Decorrido este lapso temporal, cumpre ao juiz marcar data para uma tentativa de conciliação, na qual podem estar presentes ou fazer-se representar os credores que tenham apresentado impugnações e respostas, a comissão de credores e o administrador da insolvência.

Nessa diligência são considerados reconhecidos os créditos aprovados por todos os presentes e os que possam sê-lo face aos elementos de prova constantes do processo.

Finda a tentativa de conciliação, o juiz profere despacho destinado, designadamente, a avaliar questões processuais, a declarar reconhecidos os créditos que já o possam ser e a seleccionar a matéria de facto relevante para a decisão final, separando a já assente daquela que se mostre ainda necessitada de demonstração probatória. Esta decisão tem, quanto aos créditos reconhecidos, a forma e o valor de sentença.

Se a verificação de algum dos créditos necessitar de produção de prova, a graduação de todos os créditos terá lugar na sentença final. Se assim não for, tal graduação será realizada logo no apontado despacho.

Se não houver consenso relativamente a todos os créditos e a verificação destes necessitar de produção de prova, realizar-se-á uma audiência de julgamento, na qual podem ser também ouvidos o administrador da insolvência e a comissão de credores.

Finda esta axilar diligência processual, o juiz profere sentença de verificação e graduação de todos os créditos, o que fará atendendo à ordem de prevalência legalmente estabelecida e já explanada.


8. Quais são as regras relativas aos processos de reestruturação?

No regime português, é aos credores que compete decidir se o pagamento dos seus créditos se obterá por meio de liquidação integral do património do devedor ou através da reestruturação da empresa e sua manutenção em actividade, na titularidade do devedor ou de terceiros. Estas orientações deverão constar de um plano de insolvência aprovado em assembleia de credores.

Permite-se aos titulares, caso optem pela recuperação, escolher com liberdade as medidas adequadas à consecução de tal fim.

A proposta de plano de insolvência pode ser apresentada:

a) pelo administrador da insolvência (por iniciativa própria ou mediante determinação da assembleia de credores);

b) pelo devedor (com a petição inicial ou no prazo máximo de trinta dias após a sentença de declaração de insolvência);

c) por qualquer pessoa que responda legalmente pelas dívidas da insolvência;

d) por qualquer credor ou grupo de credores cujos créditos representem pelo menos um quinto do total dos créditos não subordinados reconhecidos na sentença de verificação e graduação de créditos ou na estimativa do juiz, se esta ainda não tiver sido proferida.

Em sede de apreciação do plano com vista à respectiva homologação, o juiz, quando actue oficiosamente, limita-se a realizar um mero controlo da legalidade.

O plano de insolvência deve indicar claramente as alterações dele decorrentes para as posições jurídicas dos credores, bem como a sua finalidade, as medidas necessárias à sua execução, já realizadas ou a executar, e todos os elementos relevantes para efeitos da sua aprovação pelos titulares de créditos e homologação pelo juiz. Designadamente, dele constarão:

a) a descrição da situação patrimonial e financeira do devedor e do seu quadro de rendimentos;

b) indicação sobre se os meios de satisfação dos credores serão obtidos através de liquidação da massa insolvente, de recuperação do titular da empresa ou da transmissão da empresa a outra entidade;

c) no caso de se prever a manutenção em actividade da empresa, na titularidade do devedor ou de terceiro, e pagamentos aos credores à custa dos respectivos rendimentos, plano de investimentos, conta de exploração previsional e demonstração previsional de fluxos de caixa pelo período de ocorrência daqueles pagamentos, e balanço pró-forma, em que os elementos do activo e do passivo, tal como resultantes da homologação do plano de insolvência, são inscritos pelos respectivos valores;

d) o impacte expectável das alterações propostas, por comparação com a situação que se verificaria na ausência de qualquer plano de insolvência; e) a indicação dos preceitos legais derrogados e do âmbito dessa derrogação.

Podem constar do plano providências com incidência no passivo do devedor, nomeadamente:

a) o perdão ou redução do valor dos créditos sobre a insolvência quer quanto ao capital, quer quanto aos juros, com ou sem cláusula «salvo regresso de melhor fortuna»;

b) o condicionamento do reembolso de todos ou de parte dos créditos às disponibilidades do devedor;

c) a modificação dos prazos de vencimento ou das taxas de juro dos créditos; d) a constituição de garantias ou a cessão de bens aos credores.

Se o devedor for uma sociedade comercial, o plano pode conter previdências específicas tais como, por exemplo, ser condicionado à adopção e execução, pelos órgãos sociais, de medidas que não consubstanciem meros actos de disposição do património societário.

Podem, no entanto, ser adoptados pelo próprio plano de insolvência:

a) uma redução do capital social para cobertura de prejuízos, incluindo para zero ou outro montante inferior ao mínimo estabelecido na lei para o respectivo tipo de sociedade, desde que, neste caso, a redução seja acompanhada de aumento do capital para montante igual ou superior àquele mínimo;

b) um aumento do capital social, em dinheiro ou em espécie, a subscrever por terceiros ou por credores, nomeadamente mediante a conversão de créditos em participações sociais, com ou sem respeito pelo direito de preferência dos sócios legal ou estatutariamente previsto;

c) a alteração dos estatutos da sociedade;

d) a transformação da sociedade noutra de tipo distinto;

e) a alteração dos órgãos sociais;

f) a exclusão de todos os sócios, tratando-se de sociedade em nome colectivo ou em comandita simples, acompanhada da admissão de novos sócios;

g) a exclusão dos sócios comanditados acompanhada da redução do capital a zero, tratando-se de sociedade em comandita por acções.

Se o plano nada disser em sentido diverso, os direitos decorrentes de garantias reais e de privilégios creditórios não são por ele afectados, os créditos subordinados consideram-se objecto de perdão total e o cumprimento do plano exonera o devedor e os responsáveis legais da totalidade das dívidas da insolvência remanescentes.

Uma vez apresentada em tribunal a proposta de plano de insolvência, deve o juiz rejeitar a sua admissão:

a) se houver violação dos preceitos sobre a legitimidade para apresentar a proposta ou sobre o conteúdo do plano e os vícios forem insupríveis ou não forem sanados no prazo razoável que fixar para o efeito;

b) quando a aprovação do plano pela assembleia de credores ou a posterior homologação pelo juiz forem manifestamente inverosímeis;

c) quando o plano for notoriamente inexequível;

d) quando, sendo o proponente o devedor, o administrador da insolvência se opuser à admissão, com o acordo da comissão de credores, contanto que anteriormente tenha já sido apresentada pelo devedor e admitida pelo juiz alguma proposta de plano.

 Da decisão de admissão da proposta de plano de insolvência não cabe recurso.

Se a proposta for admitida, o juiz solicita parecer à comissão de trabalhadores ou a representantes por estes designados, à comissão de credores, se existir, ao devedor e ao administrador de insolvência.

Tal proposta é discutida e votada em assembleia de credores, a realizar depois de transitada em julgado a sentença de declaração de insolvência, de esgotado o prazo para a impugnação da lista de credores reconhecidos e da realização da assembleia de apreciação de relatório.

O plano de insolvência pode ser modificado pelo proponente, na assembleia, e posto à votação na mesma sessão com as alterações introduzidas, desde que estas, ainda que substanciais quanto a aspectos particulares de regulamentação, não contendam com o próprio cerne ou estrutura do plano ou com a finalidade prosseguida.

A votação da proposta pode, também, ter lugar por escrito, num prazo não superior a dez dias, se assim o decidir o juiz, podendo nela participar apenas os titulares de créditos com direito de voto presentes ou representados na assembleia. O voto escrito deve conter a aprovação ou a rejeição da proposta; qualquer proposta de modificação do plano de insolvência ou condicionamento do voto corresponde a rejeição.

A proposta é aprovada se recolher mais de dois terços da totalidade dos votos emitidos e mais de metade dos votos emitidos correspondentes a créditos não subordinados, não se considerando como tal as abstenções.

É necessário, contudo, que estejam presentes ou representados credores correspondentes a, pelo menos, um terço do total dos créditos com direito de voto.

Não conferem, no entanto, direito de voto, os créditos que não sejam modificados pela parte dispositiva do plano e os créditos subordinados de determinado grau, se o plano decretar o perdão integral de todos os créditos de graus hierarquicamente inferiores e não atribuir qualquer valor económico ao devedor ou aos respectivos sócios, associados ou membros, consoante o caso.

Se, porém, em resultado da aplicação destes critérios, todos os créditos resultarem privados do direito de voto, os créditos que não sejam modificados pela parte dispositiva do plano passam a conferir direito de voto.

Depois de aprovado pelos credores, o plano de insolvência é homologado pelo juiz. Este pode, no entanto, recusar a respectiva homologação, oficiosamente, no caso de violação não negligenciável de regras procedimentais ou das normas aplicáveis ao seu conteúdo, qualquer que seja a sua natureza, e ainda quando, no prazo razoável que estabeleça, não se verifiquem as condições suspensivas do plano ou não sejam praticados os actos ou executadas as medidas que devam preceder a homologação.

As alterações dos créditos sobre a insolvência, geradas pelo plano de insolvência, produzem efeitos a partir da sentença de homologação, o que ocorre independentemente de tais créditos terem sido, ou não, reclamados ou verificados.

A sentença de homologação confere eficácia a quaisquer actos ou negócios jurídicos previstos no plano, independentemente da forma consagrada na lei, desde que constem do processo, por escrito, as declarações de vontade de terceiros e dos credores que não tenham votado favoravelmente tal plano ou que, nos seus termos, devessem ser emitidas posteriormente à aprovação, mas prescindindo-se das declarações de vontade do devedor cujo consentimento não seja obrigatório.

A sentença homologatória constitui, designadamente, título bastante para:

a) a constituição da nova sociedade ou sociedades e para a transmissão em seu benefício dos bens e direitos que deva adquirir, assim como para a realização dos respectivos registos;

b) a redução de capital, aumento de capital, modificação dos estatutos, transformação, exclusão de sócios e alteração dos órgãos sociais da sociedade devedora, bem como para a realização dos respectivos registos.

As providências previstas no plano de insolvência com incidência no passivo do devedor não afectam a existência nem o montante dos direitos dos credores da insolvência contra os condevedores ou os terceiros garantes da obrigação, mas estes sujeitos apenas poderão agir contra o devedor em via de regresso nos termos em que o credor da insolvência pudesse exercer contra ele os seus direitos.

 Se o devedor se constituir em mora ou for declarado em situação de insolvência em outro processo durante a execução do plano de insolvência, ficam sem efeito, relativamente a alguns ou a todos os créditos, o perdão e moratória previstos em tal plano. Este pode, no entanto, dispor em sentido diverso quanto às consequências do incumprimento ou ainda estabelecer a produção das mesmas quando se verifiquem acontecimentos de outro tipo no prazo de três anos após a data da sentença homologatória.

No caso de o plano aprovado determinar o encerramento do processo, o administrador procede, até ao apontado desfecho, ao pagamento das dívidas da massa insolvente. Havendo débitos litigiosos, são os mesmos acautelados mediante a prestação de caução pelo administrador. 

 O plano de insolvência que implique o encerramento do processo pode prever que a sua execução seja fiscalizada pelo administrador e que a autorização deste seja necessária para a prática de determinados actos pelo devedor ou pela nova sociedade ou sociedades.


9. Quais são as regras relativas ao processo de liquidação?

  Na assembleia de credores destinada a avaliar o relatório apresentado pelo administrador, que se realiza após a sentença de declaração da insolvência, é igualmente decidido se o estabelecimento ou estabelecimentos do devedor, compreendidos na massa insolvente, devem ser mantidos em actividade ou encerrados.

Porém, se a comissão de credores autorizar ou, na sua falta, o devedor não se opuser, ou ainda, opondo-se o devedor, o juiz autorizar, pode o administrador da insolvência proceder ao encerramento dos estabelecimentos do devedor em data anterior à assembleia de apreciação do relatório.

Se a assembleia cometer ao administrador da insolvência o encargo de elaborar um plano de insolvência, pode determinar a suspensão da liquidação e partilha da massa insolvente. Esta suspensão cessa se o plano não for apresentado nos sessenta dias subsequentes ou se não vier a ser aprovado.

Na falta de instruções por parte dos credores, no sentido de ser preparado um plano de insolvência, deve o administrador iniciar de imediato a liquidação dos bens já apreendidos para a massa insolvente, independentemente da verificação do passivo, na medida em que a tanto se não oponham as deliberações tomadas pelos credores na referida assembleia.

Tratando-se de bens deterioráveis ou depreciáveis, deve o administrador da insolvência, mediante prévia concordância da comissão de credores ou, na sua falta, do juiz, promover a imediata venda ainda que a liquidação esteja suspensa.

Verificado o direito de restituição ou separação de bens indivisos ou apurada a existência de bens de que o insolvente seja contitular, só se liquida no processo de insolvência o direito que o insolvente tenha sobre esses bens.

 É necessário o consentimento da comissão de credores ou, na sua falta, da assembleia de credores, para a prática de actos jurídicos que assumam especial relevo para o processo de insolvência. Entre estes actos encontram-se:

a) a venda da empresa, de estabelecimentos ou da totalidade das existências;

b) a alienação de bens necessários à continuação da exploração da empresa, anteriormente ao respectivo encerramento;

c) a alienação de participações noutras sociedades destinadas a garantir o estabelecimento com estas de uma relação duradoura;

d) a aquisição de imóveis;

e) a celebração de novos contratos de execução duradoura;

f) a assunção de obrigações de terceiros e a constituição de garantias;

g) a alienação de qualquer bem da empresa por preço igual ou superior a € 10 000 e que represente, pelo menos, 10% do valor da massa insolvente, tal como existente à data da declaração da insolvência, salvo se se tratar de bens do activo circulante ou for fácil a sua substituição por outros da mesma natureza.

Decorre da lei uma clara preferência pela venda da empresa como um todo, incumbindo-se o administrador da insolvência de, desde o início de funções, angariar compradores para esse efeito. Só não se assumirá a concretização desta orientação normativa se não existir proposta satisfatória ou se reconhecer vantagem na liquidação ou alienação separada de certas partes.

O administrador da insolvência pode escolher a modalidade de alienação dos bens, sem prejuízo de audição dos credores com garantia real.

À medida que a liquidação se for efectuando, é o seu produto depositado à ordem da administração da massa.

O administrador da insolvência não pode adquirir, directamente ou por interposta pessoa, bens ou direitos compreendidos na massa insolvente, qualquer que seja a modalidade da venda.

A liquidação deve ser efectuada no prazo de um ano contado da data da assembleia de apreciação do relatório. O não cumprimento deste prazo pode conduzir à destituição, com justa causa, do administrador.

Se o devedor for uma pessoa singular e a massa insolvente não compreender uma empresa, o juiz pode dispensar a liquidação da massa, no todo ou em parte, desde que o devedor entregue ao administrador uma importância em dinheiro não inferior à que resultaria dessa liquidação. A dispensa da liquidação supõe uma solicitação nesse sentido por parte do administrador, com o acordo prévio do devedor, ficando a decisão sem efeito se este não fizer entrega, no prazo de oito dias, da importância fixada pelo juiz.

O pagamento dos créditos sobre a insolvência apenas contempla os que estiverem verificados por sentença transitada em julgado. Esse pagamento é, no entanto, precedido da dedução, na massa insolvente, dos bens ou direitos necessários à satisfação das dívidas da massa, incluindo as previsíveis até ao encerramento do processo.

A liquidação dos créditos tem lugar de acordo com a prioridade que lhes caiba.

O pagamento aos credores garantidos através garantia real é feito pelo produto da venda dos bens onerados, com respeito pela respectiva prioridade. Os créditos que não fiquem integralmente pagos e perante os quais o devedor responda pela generalidade do seu património são incluídos, pelo remanescente, como créditos comuns.

O pagamento dos créditos privilegiados é feito à custa dos bens não afectos a garantias reais prevalecentes, de acordo com a prioridade que lhes caiba, sendo também incluídos como créditos comuns quando não sejam integralmente pagos.

Os credores comuns são pagos na proporção dos seus créditos, se a massa for insuficiente para a sua satisfação total.

Os créditos subordinados são saldados depois de integralmente pagos os créditos comuns, de acordo com ordem legal e na proporção dos respectivos montantes, se a massa for insuficiente para a sua satisfação integral.

Está prevista a possibilidade de rateios parciais sempre que haja em depósito quantias que assegurem uma distribuição não inferior a 5% do valor dos créditos privilegiados, comuns ou subordinados.

Quando, além do insolvente, outro devedor solidário com ele se encontre na mesma situação, o credor não recebe qualquer quantia sem que apresente certidão comprovativa dos montantes recebidos nos processos de insolvência dos restantes devedores; o administrador da insolvência dá conhecimento do pagamento nos demais processos. O devedor solidário insolvente que liquide a dívida apenas parcialmente não pode ser pago nos processos de insolvência dos condevedores sem que o credor se encontre integralmente satisfeito.

Havendo recurso da sentença de verificação e graduação de créditos, ou protesto por acção pendente, consideram-se condicionalmente verificados os créditos dos autores do protesto ou objecto do recurso, neste último caso pelo montante máximo que puder resultar do conhecimento do mesmo, para o efeito de serem atendidos nos rateios que se efectuarem, devendo continuar, porém, depositadas as quantias que por estes lhes sejam atribuídas.

Após a decisão definitiva do recurso ou da acção, é autorizado o levantamento das quantias depositadas, na medida que se imponha, ou efectuado o rateio delas pelos credores, conforme os casos; sendo o levantamento parcial, o rateio terá por objecto a importância sobrante.

Aquele que, por seu recurso ou protesto, tenha obstado ao levantamento de qualquer quantia, e venha a decair, deverá indemnizar os credores lesados, pagando juros de mora às taxas legais pela quantia retardada, desde a data do rateio em que tenha sido incluída. Sendo o protesto posterior à efectivação de algum rateio, deve ser atribuído aos credores em causa, em rateios ulteriores, o montante adicional necessário ao restabelecimento da igualdade com os credores equiparados, sem prejuízo da manutenção desse montante em depósito se a acção não tiver ainda decisão definitiva.

Os créditos sob condição suspensiva são atendidos pelo seu valor nominal nos rateios parciais, devendo continuar, porém, depositadas as quantias que por estes lhes sejam atribuídas, na pendência da condição.

Encerrada a liquidação da massa insolvente, a distribuição e o rateio final são efectuados pela secretaria do tribunal, sendo todos os pagamentos efectuados por meio de cheques sobre a conta da insolvência.

Se o produto da liquidação for suficiente para o pagamento da integralidade dos créditos sobre a insolvência, o saldo é entregue ao devedor pelo administrador da insolvência.

Se o devedor não for uma pessoa singular, o administrador da insolvência entrega às pessoas que nele participem a parte do saldo que lhes pertenceria se a liquidação fosse efectuada fora do processo de insolvência, ou cumpre o que de diverso estiver a este respeito legal ou estatutariamente previsto.


10. Quais as condições para o encerramento do processo?

O processo de insolvência pode ser logo encerrado com a sentença de declaração da insolvência, quando haja indícios de insuficiência do activo da empresa para assegurar o pagamento das custas do processo e das dívidas previsíveis da massa insolvente.

Neste caso, o juiz deverá fazer menção desse facto em tal sentença e declarar aberto o incidente de qualificação com carácter limitado. A decisão judicial assumirá, neste contexto, uma estrutura simplificada.

Este regime não se aplica, porém, quando o devedor seja uma pessoa singular e haja requerido, até à sentença de declaração de insolvência, a exoneração do passivo restante.

Prosseguindo o processo após a declaração de insolvência, o juiz declara o seu encerramento:

a) após a realização do rateio final;

b) após o trânsito em julgado da decisão de homologação do plano de insolvência, se a isso não se opuser o conteúdo deste;

c) a pedido do devedor, quando este deixe de se encontrar em situação de insolvência ou todos os credores prestem o seu consentimento;

d) quando o administrador da insolvência constate a insuficiência da massa insolvente para satisfazer as custas do processo e as restantes dívidas da massa.

Os credores são notificados do pedido de encerramento do processo, deduzido pelo devedor com fundamento na cessação da situação de insolvência, para deduzirem oposição, querendo, em oito dias. Antes de decidir, o juiz ouve o administrador da insolvência e a comissão de credores, se existir.

O encerramento do processo determina:

a) a cessação de todos os efeitos que resultam da declaração de insolvência (por exemplo, o devedor recupera o direito de disposição dos seus bens e a livre gestão dos seus negócios, sem prejuízo dos efeitos emergentes da qualificação da insolvência como culposa);

b) a cessação das atribuições da comissão de credores e do administrador da insolvência, com excepção das referentes à apresentação de contas e das conferidas pelo plano de insolvência; c) a possibilidade de exercício, pelos credores, dos seus direitos contra o devedor;

d) a possibilidade de reclamação, pelos credores da massa, dos seus direitos não satisfeitos.

Estão previstos efeitos específicos para as situações em que encerramento do processo tem lugar antes do rateio final. Por exemplo, este encerramento determina, em regra, a ineficácia das resoluções de actos em benefício da massa insolvente, a extinção da instância dos processos de verificação de créditos e de restituição e separação de bens já liquidados, que se encontrem pendentes, e a extinção da instância das acções pendentes instauradas pelo administrador da insolvência contra os responsáveis legais pelas dívidas do insolvente.

Outros efeitos estão também especialmente previstos para as situações em que o insolvente seja uma sociedade comercial. Assim, no caso de encerramento do processo com fundamento na homologação de um plano de insolvência que preveja a continuidade da sociedade, esta retoma a sua actividade, independentemente de deliberação dos sócios.

A sociedade pode ainda retomar a sua actividade se o encerramento tiver sido pedido pelo devedor e os sócios assim deliberarem.

Com o registo do encerramento do processo após o rateio final, a sociedade considera-se extinta.
 No caso de encerramento por insuficiência da massa, a liquidação da sociedade prossegue, nos termos gerais.

Em todos os processos de insolvência, é oficiosamente aberto um incidente para apuramento das respectivas causas, podendo a insolvência ser qualificada como fortuita ou culposa com base nos elementos juntos aos autos pelos credores e em parecer elaborado pelo administrador. Este incidente não tem efeitos, porém, quanto à eventual responsabilidade penal ou à avaliação da existência de responsabilidade civil.

A insolvência é culposa quando a situação tiver sido criada ou agravada em consequência da actuação, dolosa ou com culpa grave, do devedor ou dos seus administradores, de facto ou de direito, nos três anos anteriores ao início do processo.

Considera-se sempre culposa a insolvência do devedor que não seja pessoa singular quando os respectivos administradores assumam comportamentos tipificados na lei. Por exemplo, a insolvência deve ser tida como culposa quando os administradores tenham:

a) destruído, danificado, inutilizado, ocultado, ou feito desaparecer, no todo ou em parte considerável, o património do devedor;

b) criado ou agravado artificialmente passivos ou prejuízos, ou reduzido lucros, causando, nomeadamente, a celebração pelo devedor de negócios ruinosos em seu proveito ou no de pessoas com eles especialmente relacionadas;

c) comprado mercadorias a crédito, revendendo-as ou entregando-as em pagamento por preço sensivelmente inferior ao corrente, antes de satisfeita a obrigação;

d) disposto dos bens do devedor em proveito pessoal ou de terceiros;

e) exercido, a coberto da personalidade colectiva da empresa, se for o caso, uma actividade em proveito pessoal ou de terceiros e em prejuízo da empresa;

f) feito do crédito ou dos bens do devedor uso contrário ao interesse deste, em proveito pessoal ou de terceiros, designadamente para favorecer outra empresa na qual tenham interesse directo ou indirecto;

g) prosseguido, no seu interesse pessoal ou de terceiro, uma exploração deficitária, não obstante saberem ou deverem saber que esta conduziria com grande probabilidade a uma situação de insolvência;

h) incumprido em termos substanciais a obrigação de manter contabilidade organizada, mantido uma contabilidade fictícia ou uma dupla contabilidade ou praticado irregularidade com prejuízo relevante para a compreensão da situação patrimonial e financeira do devedor;

i) incumprido, de forma reiterada, os seus deveres de apresentação e de colaboração, até à data da elaboração do parecer referido no Código da Insolvência e da Recuperação das Empresas.

Presume-se a existência de culpa grave quando os administradores, de direito ou de facto, do devedor que não seja uma pessoa singular tenham incumprido: a) o dever de requerer a declaração de insolvência; b) a obrigação de elaborar as contas anuais, no prazo legal, de submetê-las à devida fiscalização ou de as depositar na conservatória do registo comercial.

O regime ora enunciado é aplicável, com as necessárias adaptações, à actuação de pessoa singular insolvente e seus administradores, na medida em que a isso não se opuser a diversidade das situações.

Se a pessoa singular insolvente não estiver obrigada a apresentar-se à insolvência, esta não será considerada culposa em virtude da mera omissão ou retardamento na apresentação, ainda que determinante de um agravamento da situação económica do insolvente.

Sendo a insolvência qualificada como culposa, podem ser aplicadas às pessoas afectadas pela qualificação − devedor ou seus administradores – as seguintes medidas:

a) inabilitação por um período de dois a dez anos;

b) inibição para o exercício do comércio por um período de dois a dez anos, bem como para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de actividade económica, empresa pública ou cooperativa;

c) perda de quaisquer créditos sobre a insolvência ou sobre a massa insolvente e a sua condenação na restituição dos bens ou direitos já recebidos em pagamento desses créditos.

No caso de encerramento liminar por insuficiência da massa insolvente, o incidente tem carácter limitado, destinando-se apenas ao apuramento da conduta do devedor e/ou respectivos administradores para efeitos exclusivos de inabilitação ou inibição.

Logo que haja conhecimento de factos que indiciem a prática dos crimes de insolvência dolosa ou negligente ou de favorecimento de credores, o juiz deverá determinar que seja dado conhecimento da ocorrência ao Ministério Público, com vista ao eventual exercício da acção penal. Tais crimes são punidos com penas de prisão ou multa.
Se, em consequência da concretização desses factos, resultarem frustrados, no processo especial de insolvência, créditos de natureza laboral, serão agravadas as penas aplicáveis.

In Ponto de Contacto Português da Rede Judiciária Europeia em Matéria Civil e Comercial